Transcrições do
livro “O demônio do meio-dia” de Andrew Salomon. Editora Objetiva.
Por Ida Böing Magalhães de Sousa
Uma obra que examina a depressão e
as emoções que a rodeiam; revela suas implicações históricas, sociais,
biológicas, químicas e médicas.
1- Quando a
depressão chega, degrada o eu da pessoa e finalmente eclipsa sua capacidade de
dar ou receber afeição. (p. 15)
2- Depressão é a
dor que veda cada espaço através do qual outrora você entrava em contato com o
mundo ou o mundo com você. (p. 19)
3- A depressão é
um estado inimaginável para quem não a conhece. (p. 28)
4- Ouça as
pessoas que amam você. Acredite que vale a pena viver por elas, mesmo que você
não acredite nisso (…). Seja corajoso; seja forte; tome suas pílulas;
exercite-se, porque isso lhe fará bem, mesmo que cada passo pese uma tonelada.
(p. 29)
5- O caminho
mais certo para sair da depressão é não gostar dela e não se acostumar com ela.
Bloqueie os terríveis pensamentos que lhe invadem a mente. (p. 29)
6- Nem a
depressão nem o câncer de pele são uma criação do século XXI. Assim como o
câncer de pele, a depressão é uma afecção corporal que aumentou muito em tempos
recentes por motivos bastante específicos. (p. 30)
7- A depressão
que ocorre como uma fase da enfermidade bipolar é muito mais fortemente ligada
ao fator genético (…). Embora ela responda mais amplamente ao tratamento, não é
mais fácil de ser controlada, sobretudo porque drogas antidepressivas podem
desencadear a mania. (p. 47)
8- Não há vida
que não contenha motivos para o desespero, mas algumas pessoas chegam perto
demais da borda, enquanto outras conseguem ficar tristes, mas numa clareira, à
distância do abismo. (p. 47)
9 – Com a
depressão, a visão se estreita e começa a se fechar; é como tentar ver tevê na
qual se vê a imagem muito mal, não se pode enxergar o rosto das pessoas, nada
tem contornos. (p. 48)
10- A depressão,
como o amor, lida com clichês, e é difícil falar dela sem cair numa retórica de
melosas melodias pop; quando sentida, é tão vivida que a noção de que outros já
conheceram algo semelhante parece totalmente implausível. (p. 50)
11- Os minutos
de depressão são como anos terríveis, baseados em alguma noção artificial de
tempo. (p. 51)
12- A depressão
tende a ser recorrente; tende a ir ladeira abaixo; assim, diante de várias
crises, deve-se considerar o tratamento preventivo de longo prazo para evitar
todas as terríveis consequências. (p. 55)
13- Quanto mais
tempo se permanece deprimido, maior a probabilidade de ocorrer uma lesão
significativa, o que pode levar à neuropatia periférica: sua visão começa a
desaparecer e várias outras coisas podem dar errado. (p. 58)
14- Num mundo
ideal, não se tomaria droga alguma e o corpo se autoregularia perfeitamente;
quem quer tomar remédio? Mas as afirmações ridículas feitas em livros como “O
rebote do Prozac” só pode ser encarado como a cafetinagem dos medos mais
básicos de um público apreensivo. Deploro os cínicos que mantém pacientes
distantes de curas essencialmente benignas que poderiam devolver-lhes suas vidas.
(p. 78)
15- Como o
parto, a depressão é uma dor tão forte que chega a ser riscada da memória. (p.
78)
16- A remissão
da doença mental exige manutenção: todos nós periodicamente nos deparamos com
traumas físicos e psíquicos, e há boas chances de que os mais vulneráveis terão
momentos de recidiva diante de problemas. A possibilidade de termos uma vida de
relativa liberdade aumenta com uma atenção cuidadosa e responsável para com a
medicação e com conversas que nos estabilizem e produzam insight. (p. 87)
17- A medicação
e a terapia não deveriam competir – deveriam ser terapias complementares, que
podem ser usadas juntas ou separadamente, dependendo da situação do paciente.
(p. 96)
18- Um bom
terapeuta pode ajudar uma pessoa deprimida a se conectar com as pessoas ao seu
redor e estabelecer estruturas de apoio que suavizam a severidade da depressão.
(p. 98)
19- O processo
combinatório não é unicamente para as doenças mentais. O debate que coloca a
medicação em oposição à terapia é ridículo. (p. 98)
20- Ninguém
derrubou Freud ainda porque ninguém desenvolveu uma teoria um pouco melhor do
que todo aquele conflito internalizado. A questão é que agora podemos tratá-lo;
filosofar de onde ele vem não teve até agora a menor utilidade terapêutica. (p.
98)
21- Você precisa
renascer após um episódio grave e aprender os comportamentos que podem
protegê-lo contra a recidiva. Você precisa conduzir sua vida de modo diferente
do que conduzia antes. (p. 99)
22- A depressão
é uma doença, não uma escolha de vida e você precisa de ajuda ao passar por
ela. (p. 99)
23- É duro lutar
com a própria consciência, porque não se tem nenhum instrumento nessa batalha a
não ser a própria consciência. Pense apenas em coisas adoráveis, adoráveis e
maravilhosas, e elas minarão sua dor. Pense no que não tem vontade de pensar.
Pode ser falso e auto-ilusório de certa maneira, mas funciona. Expulse da mente
as pessoas associadas a sua perda: proíba-as de entrarem em sua consciência
(…). Forçar seus pensamentos a seguirem certos padrões pode salvá-lo. (p. 103)
24- Certas
terapias cognitivas eficazes na diminuição da ansiedade baixam os níveis do
metabolismo do cérebro enquanto, como imagem no espelho, as terapias
farmacêuticas baixam os níveis de ansiedade. Esse é o princípio da medicação
antidepressiva, que ao moodificar os níveis de certos substâncias no cérebro
mudam o modo como um paciente se sente e age. (p. 119)
25- Outro
sistema que tem ajudado muitas pessoas a lidar com a doença é a fé. Podemos
imaginar que a consciência humana é ligada pelos lados de um triângulo: o teológico,
o psicológico e o biológico. Além disso, a fé no mundo moderno tende a ser
altamente pessoal (…) ela nos dá motivos para viver (…) nos oferece dignidade e
objetivo em nosso desamparo. Muitos objetivos da terapia cognitiva e
psicanalítica são conseguidos pelos sistemas de crença que subjaz nas
principais religiões – o redirecionamento da energia fora do eu, a descoberta
da auto-estima, a paciência, a amplitude da compreensão (…). A esperança é um
grande profilático e a fé em sua essência oferece esperança. (p. 123)
26- Tomar
medicamento não é fraqueza – isso não significa que você não consiga lidar com
sua vida – é corajoso. Assim como não é fraqueza buscar ajuda de um terapeuta.
A fé em Deus e qualquer forma de fé em si mesmo são ótimas. Você precisa levar
suas terapias, de todos os tipos, com você para a luta. Não pode ficar
esperando a cura. (p. 126)
27- Os
exercícios físicos e a dieta desempenham papel importante no progresso da
doença afetiva e um considerável controle pode ser conseguido com bons regimes
em busca de boa forma física e nutricional. (p. 130)
28- Os
deprimidos abusam de substâncias numa aposta para se livrarem da depressão.
Elas perturbam suas vidas a ponto de ficarem deprimidas pelo dano causado. (…)
Algumas pessoas têm predisposição genética a usar tais substâncias. (p. 201)
29- * A forma e
a particularidade da depressão já passaram por mil reviravoltas e o tratamento
da doença alternou-se entre o ridículo e o sublime, mas a interação social e o
desespero incessante são tão antigos quanto as tribos das montanhas, se não tão
antigos quanto as próprias montanhas (…). Entender a história da depressão é
entender a invenção do ser humano como agora o conhecemos e incorporamos. Nossa
pós-modernidade, cognitivamente focalizada, semi-alienada, em que se consome
Prozac feito pipoca, é apenas um estágio na contínua compreensão e controle do
humor e da personalidade. (p. 265)
30- A medicina
não nos reinventará. Jamais escaparemos da própria escolha. O eu de alguém
reside no escolher, reside em cada escolha, a cada dia. Eu sou o que escolhe
tomar remédio duas vezes por dia. Eu sou o que escolhe conversar com meu pai.
Que escolhe ligar para meu irmão, ter um cachorro, sair da cama (ou não). (p.
379)
31- O que se
pode fazer quando se vê uma pessoa presa na armadilha da própria mente? Não se
pode arrancá-lo de sua infelicidade só com amor (embora se possa às vezes
distraí-la). Não é agradável sentar-se imóvel na escuridão da mente do outro,
embora seja quase sempre pior assistir à decadência da mente do lado de fora.
Podemos ficar nos remoendo à distância ou nos aproximar chegando o mais perto
possível. Às vezes a maneira de estar perto é ficar em silêncio, ou mesmo
distante. Não depende de nós, do lado de fora, decidir; depende do nosso
discernimento. A depressão é solitária acima de tudo, mas pode gerar o oposto
da solidão (…). Procure mentalizar o isolamento. Faça-o através de xícaras de
chá ou de longas conversas, ou sentando-se num aposento próximo e ficando em
silêncio ou de qualquer outro modo que se ajuste às circunstâncias, mas faça-o.
E faça-o com boa vontade. (p. 383)