terça-feira, 13 de maio de 2014

Transcrições do livro “O demônio do meio-dia”

                                       
Transcrições do livro “O demônio do meio-dia” de Andrew Salomon. Editora Objetiva.

Por Ida Böing Magalhães de Sousa

            Uma obra que examina a depressão e as emoções que a rodeiam; revela suas implicações históricas, sociais, biológicas, químicas e médicas.

1- Quando a depressão chega, degrada o eu da pessoa e finalmente eclipsa sua capacidade de dar ou receber afeição. (p. 15)

2- Depressão é a dor que veda cada espaço através do qual outrora você entrava em contato com o mundo ou o mundo com você. (p. 19)

3- A depressão é um estado inimaginável para quem não a conhece. (p. 28)

4- Ouça as pessoas que amam você. Acredite que vale a pena viver por elas, mesmo que você não acredite nisso (…). Seja corajoso; seja forte; tome suas pílulas; exercite-se, porque isso lhe fará bem, mesmo que cada passo pese uma tonelada. (p. 29)

5- O caminho mais certo para sair da depressão é não gostar dela e não se acostumar com ela. Bloqueie os terríveis pensamentos que lhe invadem a mente. (p. 29)

6- Nem a depressão nem o câncer de pele são uma criação do século XXI. Assim como o câncer de pele, a depressão é uma afecção corporal que aumentou muito em tempos recentes por motivos bastante específicos. (p. 30)

7- A depressão que ocorre como uma fase da enfermidade bipolar é muito mais fortemente ligada ao fator genético (…). Embora ela responda mais amplamente ao tratamento, não é mais fácil de ser controlada, sobretudo porque drogas antidepressivas podem desencadear a mania. (p. 47)

8- Não há vida que não contenha motivos para o desespero, mas algumas pessoas chegam perto demais da borda, enquanto outras conseguem ficar tristes, mas numa clareira, à distância do abismo. (p. 47)

9 – Com a depressão, a visão se estreita e começa a se fechar; é como tentar ver tevê na qual se vê a imagem muito mal, não se pode enxergar o rosto das pessoas, nada tem contornos. (p. 48)

10- A depressão, como o amor, lida com clichês, e é difícil falar dela sem cair numa retórica de melosas melodias pop; quando sentida, é tão vivida que a noção de que outros já conheceram algo semelhante parece totalmente implausível. (p. 50)

11- Os minutos de depressão são como anos terríveis, baseados em alguma noção artificial de tempo. (p. 51)

12- A depressão tende a ser recorrente; tende a ir ladeira abaixo; assim, diante de várias crises, deve-se considerar o tratamento preventivo de longo prazo para evitar todas as terríveis consequências. (p. 55)

13- Quanto mais tempo se permanece deprimido, maior a probabilidade de ocorrer uma lesão significativa, o que pode levar à neuropatia periférica: sua visão começa a desaparecer e várias outras coisas podem dar errado. (p. 58)

14- Num mundo ideal, não se tomaria droga alguma e o corpo se autoregularia perfeitamente; quem quer tomar remédio? Mas as afirmações ridículas feitas em livros como “O rebote do Prozac” só pode ser encarado como a cafetinagem dos medos mais básicos de um público apreensivo. Deploro os cínicos que mantém pacientes distantes de curas essencialmente benignas que poderiam devolver-lhes suas vidas. (p. 78)

15- Como o parto, a depressão é uma dor tão forte que chega a ser riscada da memória. (p. 78)

16- A remissão da doença mental exige manutenção: todos nós periodicamente nos deparamos com traumas físicos e psíquicos, e há boas chances de que os mais vulneráveis terão momentos de recidiva diante de problemas. A possibilidade de termos uma vida de relativa liberdade aumenta com uma atenção cuidadosa e responsável para com a medicação e com conversas que nos estabilizem e produzam insight. (p. 87)

17- A medicação e a terapia não deveriam competir – deveriam ser terapias complementares, que podem ser usadas juntas ou separadamente, dependendo da situação do paciente. (p. 96)

18- Um bom terapeuta pode ajudar uma pessoa deprimida a se conectar com as pessoas ao seu redor e estabelecer estruturas de apoio que suavizam a severidade da depressão. (p. 98)

19- O processo combinatório não é unicamente para as doenças mentais. O debate que coloca a medicação em oposição à terapia é ridículo. (p. 98)

20- Ninguém derrubou Freud ainda porque ninguém desenvolveu uma teoria um pouco melhor do que todo aquele conflito internalizado. A questão é que agora podemos tratá-lo; filosofar de onde ele vem não teve até agora a menor utilidade terapêutica. (p. 98)

21- Você precisa renascer após um episódio grave e aprender os comportamentos que podem protegê-lo contra a recidiva. Você precisa conduzir sua vida de modo diferente do que conduzia antes. (p. 99)

22- A depressão é uma doença, não uma escolha de vida e você precisa de ajuda ao passar por ela. (p. 99)

23- É duro lutar com a própria consciência, porque não se tem nenhum instrumento nessa batalha a não ser a própria consciência. Pense apenas em coisas adoráveis, adoráveis e maravilhosas, e elas minarão sua dor. Pense no que não tem vontade de pensar. Pode ser falso e auto-ilusório de certa maneira, mas funciona. Expulse da mente as pessoas associadas a sua perda: proíba-as de entrarem em sua consciência (…). Forçar seus pensamentos a seguirem certos padrões pode salvá-lo. (p. 103)

24- Certas terapias cognitivas eficazes na diminuição da ansiedade baixam os níveis do metabolismo do cérebro enquanto, como imagem no espelho, as terapias farmacêuticas baixam os níveis de ansiedade. Esse é o princípio da medicação antidepressiva, que ao moodificar os níveis de certos substâncias no cérebro mudam o modo como um paciente se sente e age. (p. 119)

25- Outro sistema que tem ajudado muitas pessoas a lidar com a doença é a fé. Podemos imaginar que a consciência humana é ligada pelos lados de um triângulo: o teológico, o psicológico e o biológico. Além disso, a fé no mundo moderno tende a ser altamente pessoal (…) ela nos dá motivos para viver (…) nos oferece dignidade e objetivo em nosso desamparo. Muitos objetivos da terapia cognitiva e psicanalítica são conseguidos pelos sistemas de crença que subjaz nas principais religiões – o redirecionamento da energia fora do eu, a descoberta da auto-estima, a paciência, a amplitude da compreensão (…). A esperança é um grande profilático e a fé em sua essência oferece esperança. (p. 123)

26- Tomar medicamento não é fraqueza – isso não significa que você não consiga lidar com sua vida – é corajoso. Assim como não é fraqueza buscar ajuda de um terapeuta. A fé em Deus e qualquer forma de fé em si mesmo são ótimas. Você precisa levar suas terapias, de todos os tipos, com você para a luta. Não pode ficar esperando a cura. (p. 126)

27- Os exercícios físicos e a dieta desempenham papel importante no progresso da doença afetiva e um considerável controle pode ser conseguido com bons regimes em busca de boa forma física e nutricional. (p. 130)

28- Os deprimidos abusam de substâncias numa aposta para se livrarem da depressão. Elas perturbam suas vidas a ponto de ficarem deprimidas pelo dano causado. (…) Algumas pessoas têm predisposição genética a usar tais substâncias. (p. 201)

29- * A forma e a particularidade da depressão já passaram por mil reviravoltas e o tratamento da doença alternou-se entre o ridículo e o sublime, mas a interação social e o desespero incessante são tão antigos quanto as tribos das montanhas, se não tão antigos quanto as próprias montanhas (…). Entender a história da depressão é entender a invenção do ser humano como agora o conhecemos e incorporamos. Nossa pós-modernidade, cognitivamente focalizada, semi-alienada, em que se consome Prozac feito pipoca, é apenas um estágio na contínua compreensão e controle do humor e da personalidade. (p. 265)

30- A medicina não nos reinventará. Jamais escaparemos da própria escolha. O eu de alguém reside no escolher, reside em cada escolha, a cada dia. Eu sou o que escolhe tomar remédio duas vezes por dia. Eu sou o que escolhe conversar com meu pai. Que escolhe ligar para meu irmão, ter um cachorro, sair da cama (ou não). (p. 379)

31- O que se pode fazer quando se vê uma pessoa presa na armadilha da própria mente? Não se pode arrancá-lo de sua infelicidade só com amor (embora se possa às vezes distraí-la). Não é agradável sentar-se imóvel na escuridão da mente do outro, embora seja quase sempre pior assistir à decadência da mente do lado de fora. Podemos ficar nos remoendo à distância ou nos aproximar chegando o mais perto possível. Às vezes a maneira de estar perto é ficar em silêncio, ou mesmo distante. Não depende de nós, do lado de fora, decidir; depende do nosso discernimento. A depressão é solitária acima de tudo, mas pode gerar o oposto da solidão (…). Procure mentalizar o isolamento. Faça-o através de xícaras de chá ou de longas conversas, ou sentando-se num aposento próximo e ficando em silêncio ou de qualquer outro modo que se ajuste às circunstâncias, mas faça-o. E faça-o com boa vontade. (p. 383)